31/03/2011

Marcela

Marcela é uma garota que decidiu subir numa corda bamba por opção – pra sentir a adrenalina, se agarrar à “liberdade” – e agora, feito gatinho de desenho animado preso em árvore, está com medo e não sabe como descer.
Marcela, isso é corda bamba ou prancha de tubarão?

Ô Marcela, menina, esse papo de tudo ou nada, oito ou oitenta ficou lá pros anos noventa! Você se rebate feito criança no meio do alto mar, julgando linda a liberdade de (tentar) nadar pra qualquer canto, mas está só engolindo água!
O mar é fundo, Marcela!

Já pensou que esse oceano todo em que vive, se bate e rebate pode ser só um copo de água salgada?
Água salgada não mata a sede, menina!

Marcela, que vida é essa de ser levada pelas ondas da vida, sem ninguém ao redor, como uma cigana dos mares? Todos esses corpos que esbarra pelas correntezas são tão gelados, tão plásticos!

Por acaso não sabes, menina, como é bom ter um porto seco e quentinho? Creio que um dia chegará em um; Sim, chegará...
só não sei se
viva.


30/03/2011

Fotografia



Os olhos mirados no céu e na boca um “POR QUE?!” prestes a explodir. Os joelhos no chão, no meio da rua. Chovia.

Lá de cima ninguém respondeu. O céu continuava castanho, quieto e um pouco sarcástico, pensou.

O salgado do rosto misturou-se com o ácido da chuva e então, ficando de pé, começou a andar de novo, só que agora alguns mililitros mais leve.

Chorar faz dessas coisas; Transforma momentos ordinários em fotografias que ficam pregadas nos corredores dos olhos e tatuadas na retina.

23/03/2011

Andante de Um Olhar





Os olhos eram duas pontes que apontavam direto pro meu peito; 

duas trilhas estiradas no meu peito e entravam em mim como setas
duas estradas castanhas de se perder a vista, como fossem uma eterna sensação de longa viagem e de regresso exausto e prazeroso – ao mesmo tempo. 

Eu nunca soube aonde esses caminhos iriam me levar e, numa surpresa deleitável, acabo trombando comigo mesmo no meio do caminho;

Achei um Eu perdido (perdido?) lá dentro dela e invés de escravizá-lo
 – como muitos fazem ao encontrarem-se nos outros –, 
decidi viajar por suas paragens comigo mesmo 
e provar a liberdade dessa alma 
tão fecunda.

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(inspirado nela, minha musa ["musa..." ela vai achar isso terrivelmente brega] dos olhos nublados e
dedicado ao amigo 
Rogério Lupo, meu eu grisalho.)



18/03/2011

A Rua Lá Fora

As esquinas, azar e sorte, cheiro do prato comercial dos bares, crianças com olhos curiosos indo à escola em uniformes quentinhos, senhores de chapéu lendo jornal nas praças, mulheres correndo nos parques, céu e frio confortáveis.

Se começa a chover guarda-chuvas se abrem como poesia em papel e poderá ver sapatos e cabelos correndo ao abrigo do toldo vermelho da loja de doces.

E você aqui, lendo
eu escrevendo
e a vida lá fora.

17/03/2011

Os Carregadores de Mundo



Cada pessoa realmente carrega um mundo inteiro nas próprias costas.
Como se fosse uma longa fila para lugar algum, cada qual vai seguindo com o seu próprio mundo pesando nos ombros, naturalmente.

Assim como pequenos Atlas vão vivendo, sempre forçados a andar pra frente, chicoteados pelos labores terríveis do Tempo e as torturas do Tédio – inseparáveis e cruéis irmãos.

O que intriga é que estes pequenos grandes mundos são isentos de cor, como bolas de chumbo cinza e assim o são seus “donos”.    
Existem os corajosos que ousam descansar os ombros e, despreocupados com o Tempo e o Tédio, param para observar a paisagem e seus iguais. Brota então a Liberdade!

Eufóricos percebem milhares de cores e assim começam a colorir seus mundos com as tintas que encontram nos caminhos estreitos da Vida.

Assim enganam o Tempo e o Tédio.

Enganam a própria Morte; o trajeto final da fila.

02/03/2011

Alma na Garrafa



Há dias em que sou uma garrafa de vinho jogada no mar, deslizando. Dentro de mim apenas uma velha folha. Será que uma vida cabe numa folha?

Num dia preguiçoso eu esbarrei nuns pés bonitos, na beirada da praia de um sorriso fresco. Ela pegou a garrafa e destampou; Houve então um sorriso ou de decepção ou de esperança: A folha estava em branco. Então eu lhe disse:

-Ei garota! Escreva! Vamos... Escreva o que bem entender. A vida é tão curta e fina quanto esta folha.  Vamos! Só não me jogues no mar!

Então ela escreveu como nunca; escreveu sobre o amor.
Jogou-me no mar de novo, é verdade,
só que agora o mar era dentro
dela.